Morphine

Texto > Marco Aurélio Corrêa

Morphine foi uma banda formada pelo vocalista e baixista Mark Sandman, o saxofonista Dana Colley e o baterista Billy Conway em Cambridge, Massachusetts, EUA, no ano de 1989. A banda combinou elementos do jazze do blues com arranjos tradicionais do rock, gerando um estilo próprio de música, na medida em que não contava com um guitarrista e o baixo de Mark Sandman possuía, na maior parte das apresentações, apenas duas cordas. Contudo, durante uma apresentação de sua banda em 1999, Sandman teve um ataque fulminante do coração, na cidade italiana de Palestrina, falecendo aos 46 anos de idade. Actualmente os restantes membros desta banda formam com a vocalista Laurie Sargent os Twinemen.

Um dia quando eu era adolescente estava assistindo a MTV e passou o clipe de uma banda que usava os seguintes intrumentos: um baixo de duas cordas tocados com um slide, um sax barítono e uma bateria (pela lógica estranha deveria ser um gamelão), e sim, eu disse que vi isso na MTV, algo que eu tenho todo motivo para imaginar que algo similar nunca mais vai acontecer. Esperei até o fim do vídeo e descobri que o nome da banda era Morphine.

Imediatamente fui procurar os discos da banda numa das caças mais infrutíferas que fiz na minha vida, rodei o Rio de Janeiro inteiro e não achei nada, inclusive nos lugares renomados como a Modern Sound (que para mim até então era o melhor lugar do universo).

Tudo mais revoltante pois os discos eram lançados pela Warner. Enfim, essa foi a primeira de muitas decepçôes que tive procurando discos (muitos deles relativamente óbvios), o que nada me faz lamentar o fechamento de quase todas as lojas. Pouco depois dessa experiência ruim li numa revista que o Mark Sandman (vocalista e baixista) morreu de ataque cardíaco num palco na Itália, aí temos algo pior do que simplesmente não achar os discos, mas se é para um músico morrer, que seja assim, tocando seu instrumento num palco.

Finalmente em 2001 (eu acho) a Trama lançou por aqui toda discografia, o que me deixou um pouco puto pois já tinha comprado grande parte importado, mas foi uma coisa boa e a Trama tinha boas ideias (infelizmente nenhuma delas vendia e acabaram falindo, não contavam com o fator Brasil).

A discografia da banda possuí cinco álbuns de estúdio, os três primeiros (Good, Cure for Pain e Yes) são obras primas, os outros dois (Like Swimming e The Night) são um pouco diferentes, embora sejam também respeitáveis (o The Night teve um peso diferente pela morte do Sandman). Sandman que era um dos frontmen mais peculiares do rock, além de tocar o baixo da maneira única que falei (com variações também, usando cordas de guitarra e afinações incomuns), tinha a voz aveludada típica dos barítonos, cantando tudo de uma maneira relaxada, parecia um cara que lê uns audiobooks que eu escuto depois desse ter tomado um vinho. Escrevia as letras nos moldes da literatura beat (o que complementava o feeling jazzístico da banda), assim sendo elas tinham uma qualidade muito pessoal e temas cheios de angústia, tristeza e fatalismo.

Pelo modo que ele escrevia a questão sempre foi se essas letras eram autobiográficas, ele fez de tudo para não responder isso e nunca mais responderá. Outra coisa curiosa é que ele começou a fazer sucesso por volta dos 40 anos, essa situação lhe era incômoda e ele odiava ser lembrado disso. A música funcionava num jogo entre o baixo e o sax (um plano que tinha tudo para dar errado), juntando a óbvia influência do jazz, do rock (principalmente dos anos 50) e mais importante do blues, blues do qual eles são um dos verdadeiros herdeiros junto com alguns poucos músicos (Gun Club, Nick Cave, Swans, Tom Waits, Mark Lanegan…) e nisso não tendo nada a ver com guitarristas virtuosos que meramente usam a escalas ligadas a música e não o peso histórico, social e metafísico do estilo. Tudo isso eles juntavam em algo que chamavam de “low rock”, basicamente uma piada com o quanto do som estava no registro dos graves e o quão diferente eles eram da maioria das bandas de rock sem uma guitarra distorcida explodindo pelos amplificadores. De fato o som é bastante atmosférico, se não é sombrio é bastante cinzento, parece trilha para um filme noir, porém com swing e groove, as batidas são uma das coisas mais importantes na música deles. No último álbum as coisas finalmente ficam grandiloquentes, tem violoncelo, orgão, viola, coro, bandolim… Tudo é muito mais lento e a atmosfera muito mais lúgubre, parece uma estranha premonição da tragédia que iria acontecer.

Resultado de imagem para Morphine - The Night (Full Album)

Após a morte de Sandman os membros restantes montaram o Orchestra Morphine que coleta dinheiro para a instituição de caridade do ex-líder, também foi formado o Twinemen que faz boa música para relaxar e antes de tudo existia o Treat Her Right que é bom, apesar de ter uma maldita duma guitarra para estragar. Enfim, vou deixar o clipe que eu vi na MTV e ir lamentar que a banda não existe mais e que eu provavelmente vou morrer de um ataque cardíaco porém ligado a um monte de aparelhos.

Mark Sandman morreu como viveu: surpreendendo. Seja com sua primeira banda Traet Her Right e depois com o Morphine, deixou claro que não é necessário seguir regras para se fazer música de qualidade. Quando apareceu no início dos anos 90 com uma formação sem guitarra, com bateria, saxofone e seu baixo de duas cordas tocado com slide, o músico rompeu todos os esquemas da auto alimentada cena roqueira e foi apontado como um messias. Ben Harper, Queen of Stone Age, John Medeski estão entre os convidados deste filme a falar de sua genialidade.

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